devaneios. (I)

Rasgos – etéreos momentos de fusão, em que os medos se estendem a um passo;
e é nessa iminência em que se exibem, que os corpos se agarram – com consciência ou não – que são somente carne introvertida, assustada de si mesma.
Não nos mentem nem são verdadeiros; na verdade, não lhes preocupa a veracidade das coisas.
Ocupam-se antes em nos dizer, em breves, sinceros momentos, num contraste impulsivo, num abrir das costelas; a solidão que nos habita, que se cultiva e que cresce. No futuro a colheremos, de uma terra exausta e indiferente.
Não nos avisa, também – expõe-nos.
Nos braços de outros pois os nossos sépticos membros são cúmplices, parte do vício, parte da crença que isto é o que é suposto ser.
Olha à volta, o que vês?

E se nascesse agora a certeza, de onde quer que as certezas nasçam, que todos os humanos morreriam aos 50 anos?
Nenhuma doença mortal, nenhum acidente, nem sequer um engasgo com comida – nada nos mataria antes dos 50.
Justificar-se-iam os nutricionistas?
A cirurgia reconstrutiva?
Os esteticistas e os cabeleireiros?
Os olhos dos coelhos e os cosméticos?
A consciência de uma certeza temporal, inarredável, exaltaria o caos ou o silêncio?
Uma tirânica busca pela emancipação ou uma comunitária aceitação da natureza?
Seria a nossa alimentação igual, ou marcada pelos excessos despreocupados? A nossa actividade física igual, ou marcada pelo desleixo incauto?
Que domínio tem a morte sobre a vida?
É o fim que anuncia ou os seus jeitos arbitrários que nos contaminam?
Procuramos a vida melhor ou a de maior duração, ou ainda talvez, a vida mais longa com qualidade?
Viver sem respostas – essa escolha abstémia – é caminhar no deserto.