longitudes. (I)

I
Raros são os segundos que me viram igual,
E os que se enquadram nessa restrita definição
São segundos que não quero saber.
Quando a noite cai, lá fora, no assombro do sol a morrer,
São esses raros segundos que me assombram,
Que se elevam das raízes.
Os profundos rasgões que me originam.
A noite, em si, nada tem de impressionante
É só uma ausência como em tanto mais.
Nada estável é único.
Singular são as transições.

II
Imagino uma pequena embarcação solitária,
Nasceu da morte de um grande navio,
Um suave naufrágio no olho do oceano,
Ninguém o viu.
Navego em milhas ou quilómetros,
Não sei ler nenhum dos dois
E é com essa vaidade desmedida
Que me deito na madeira –
O chão seco da embarcação –
E desligo do infinito que me circunda.
Aceito o meu destino como uma criança um castigo,
Não sei se um dia vou crescer.
Mas rejeito o queixume da fome, da sede, do medo,
Apenas durmo na minha embarcação.
Onde me leva esta corrente?

III
Aguardo,
É um modo de carregar os dias, de os ver chegar.
O amanhã é sempre novo,
Mas não o é realmente e todos sabemos o desfecho.
Desejo, ainda,
Desejo pelo que vem, sempre pelo que vem,
E o que fica, fica para lá, nos labirintos.
Ó meu desalento,
Onde terminam estes dias?
O meu olhar prende-se nas aves que, choramingas, sobrevoam as marés,
E as marés que vão chorar na areia,
E a areia que reflete o sol,
E o sol que nasce primeiro, só depois se reflete em tudo.
Também nós deveríamos nascer primeiro;
Só depois
O excedente.